quinta-feira

THE JOSHUA TREE 30 ANOS

O THE END NO BRASIL DA TOUR DO ÁLBUM MAIS ICÔNICO DA HISTÓRIA DO U2

Rozineide M Cruz

Há quase 40 anos, no distante 1978, surgia uma banda de nome pequeno, porém, grandemente inspirador, U2. Cabalisticamente, 7 anos depois, em 1985, com 4 álbuns lançados e bem sucedidos, os 4 irlandeses de Dublin, Bono Vox, The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen Jr, participam do maior evento ativista global já realizado até hoje, o Live AID. À partir daí o U2 ganha visibilidade mundial e notoriedade como porta voz do movimento ativista de causas sociais e humanitárias no rock. Mas, nada, absolutamente nada, prepararia o mundo para o que viria dois anos mais tarde. Talvez, nem mesmo os integrantes do U2 imaginassem estar lançando em março de 1987 o álbum mais icônico da sua história, o "The Joshua Tree". Profundamente introspectivo, faixa à faixa pontilhado de reflexões políticas, humanitárias, religiosas e uma latente busca interior. 
















O álbum que enfim, catapultou o U2 ao status de maior banda do planeta, venceu o Grammy Awards de 1988 de "Álbum do Ano" e "Melhor Performance de Rock" e, é um dos álbuns mais vendidos no mundo até hoje com mais de 25 milhões de cópias vendidas. E é esse álbum que 30 anos depois, mantendo-se relevante, mereceu a celebração de sua turnê iniciada em 12 de maio em Vancouver no Canadá, passando por várias cidades dos Estados Unidos entre maio e junho, na Europa por Inglaterra, Alemanha, Itália, Espanha, Irlanda, França, Holanda e Bélgica em julho e agosto, voltando aos EUA em setembro na sua terceira parte, passando também pelo México e, finalmente, em outubro chegando a América Latina para shows na Colômbia, Argentina, Chile e seu "The End" apoteótico no Brasil, em quatro noites inesquecíveis no Estádio do Morumbi em São Paulo.


As apresentações do U2 em São Paulo não foram simplesmente um show mas, um culto ecumênico ao álbum que beira a perfeição técnica de arranjos e letras. Tudo amarrado à força vocal de Bono carregada de emoção, cala fundo na nossa alma. Inspirador, instigante, apaixonante. Tudo isso pode ser dito sobre os shows do U2 no Brasil. O início do show começa a ser desenhado. O Estádio, assim como o palco principal ficam na penumbra criando um clima intimista. A esperada entrada da banda, um a um no palco, começa com os passos solitários ao longo da passarela do tímido e focado baterista Larry Mullen Jr ao som de "The Whole Of The Moon" da banda oitentista "The Waterboys" até ele alcançar o pequeno palco em forma de árvore onde está a bateria. Ao rufar as primeiras batidas de "Sunday Bloody Sunday" surgem The Edge com seus acordes geniais à guitarra, seguido do onipresente e ovacionado, ao soltar a voz, Bono e, por fim, o refinado Adam Clayton. "Muito obrigado, Brasil", disse Bono. "Quando a gente realmente quer alguma coisa o universo conspira. Queríamos tanto estar com vocês está noite...(dia 19/10) Vai ser uma noite épica", continuou. No sábado dia 21, vimos algo incomum, um Bono mais comedido e de voz embargada em alguns momentos. A explicação veio no domingo dia 22: "Não posso acreditar nas notícias que li", disse Bono referindo-se as críticas da imprensa com relação ao show e posicionamentos da banda. Ironicamente, foi o dia em que a banda esteve mais solta. Bono fez várias referências aos Beatles como em "Bad" introduzindo trechos de "Rain" faixa do álbum Revolver e, "Stand by Me" em "I Still Haven't Found What I'm Looking For" se referindo ao ídolo John Lennon e ao mesmo tempo agradecendo ao filho Julian Lennon pela presença. "Oi gente linda...", diz Bono que também agradeceu aos fãs por terem suportado o trânsito e a chuva para ver o show.


A histeria era geral. Nesse instante, público e banda parecem um só, como se tivessem ensaiado para aquele momento. Segue o primeiro bloco com "New Year's Day", "Bad" e "Pride (In The Name of Love)" remetendo à todos de volta aos primeiros anos da banda. Ao se encaminharem para o palco principal tudo se ilumina de vermelho, o gigantesco telão em 8k Full HD formado por mais de mil placas de led e o estádio, com os balões formando o "mob" organizado pelos fanclubes. É o sinal para o início da celebração do The Joshua Tree e da segunda parte do show. Bono faz referências ao álbum e, então, a introdução da eletrizante "Where The Streets Have No Name", se torna a senha para o estádio vir a baixo. O telão, pano de fundo do espetáculo, com ondulações suaves lembrando a formação de montanhas, passa a exibir imagens em preto e branco da estrada que leva ao Parque Joshua Tree na Califórnia e, de forma impactante, a banda parece caminhar nela. A emocionante "I Still Haven't Found What I'm Looking For" tem toda a sua espiritualidade representada nas imagens de uma floresta repleta das árvores que dão nome ao álbum, Joshua Tree, elas crescem e se agigantam se conectando umas as outras como quem busca por algo, é tão hipinotizante que parece engolir banda e público. Á partir daí, segue-se a sequência faixa a faixa do álbum, cada qual com sua representatividade no telão como letras vivas para serem gravadas na alma.














O imenso deserto e sua formação rochosa surge quente em vermelho revestido pelo azul do céu dando o tom para "With Or Without you" que termina com o cair da noite, simplesmente uma pintura. "Bullet The Blue Sky" tem seus conflitos armados e angústias de ditaduras representados por filmes em negativo, imagens sobrepostas e distorcidas da banda em preto e branco, soldados e civis fardados diante da bandeira americana e, lembrando a turnê "Rattle and Run", termina com Bono segurando a câmera como um canhão, o megafone e o palco em total penumbra. O palco todo em azul, as imagens gigantescas da banda e o solo arrasador de gaita de Bono cobriram o estádio em "Running To Stand Still". Abrindo o lado B, o sincronismo entre a imagem da banda de metais do Exército da Salvação, exibida no telão, com a banda no palco em "Red Hill Mining Town", é tão impressionante quanto belíssimo e, ainda mais, quando o telão se divide colocando-as frente a frente como em um dueto. É poético.
Mais uma vez a árvore Joshua surge única e imponente na escuridão toda colorida em "In God's Country" sugerindo que a luz de Deus brilha na escuridão ou no mais profundo deserto. A influência country na música e no estilo de vida americano fica evidente em "Trip Through Your Wires" representada em cenas cotidianas pela cowgirl "Ali", esposa do Bono. No telão uma lua vermelha gigante introduz "One Tree Hill", com ela percorremos o deserto conhecendo seus habitantes nativos, índios americanos, Xamãs, que vivem por trás dos rochedos na imensidão das terras áridas dos Estados Unidos. O peso nos arranjos e na guitarra de Edge voltam em "Exit" acompanhado pela força das imagens, uma reflexão da atualidade em cenas de filme antigo onde, o personagem Trump é mencionado, as mãos de Bono surgem dos dois lados do telão de forma antagônica, cada qual com as inscrições amor e ódio, então o pastor Bono ganha o palco com seu chapéu e terno preto. Momento rock and roll puro. A última faixa do álbum é um "the end" inesquecível, "Mothers of the disappeared" é o relato do deserto que habita o coração das mães dos desaparecidos, com muita sensibilidade retratado na imagem de mulheres segurando velas que iluminam seus rostos e aos poucos vão se apagando diante de um Bono ajoelhado na passarela em frente ao palco como a pedir, que haja luz para tamanha dor na alma dessas mulheres. Mais uma vez o deserto retratado só que agora, o vazio deserto interior de cada um de nós. Belíssimo.




A introspecção do The Joshua Tree passou, a terceira parte do show nos traz de volta aos anos 2000 com os sons mais elétricos da banda. As cores agora são vivas, vibrantes para acompanhar a alegria de "Beautiful Day" que teve até introdução de "Garota de Ipanema" em sua execução, a crença no melhor de "Elevation", momento em que o baterista Larry Mullen Jr é o destaque do telão vestindo a camiseta com a frase "censura nunca mais". Na quarta (25), último dia de show, após criticas, Larry apareceu novamente no telão, dessa vez, com outra mensagem aos fãs brasileiros gravada nas costas de sua camiseta, "Amor, Ordem e Progresso". Os desenhos geométricos pintados de vermelho e o apelo em português chamava o público para "Vertigo". "Mysteriuos Way" fez parte do momento sedutor de Bono que convida uma garota de formas esculturais - a Pernambucana Juliana Sarda, subiu no palco em Paris e, aqui, deu replay -, típica brasileira para dançar com ele pela passarela do palco carregando uma câmera, filmando e sendo filmada pelo já intimidado e seduzido vocalista que, ao final, recebe dela uma bandeira do Brasil que é prontamente beijada por ele - o gesto poderia ter sido melhor se ela não tivesse colocado a bandeira no chão. Mais uma que teve seu momento "affer" Bono em show do U2 no Brasil dividindo os comentários entre amor e ódio. Constrangido com esse momento já que a esposa Alison estava presente, Bono faz uma média e dedica as duas próximas músicas á ela, as esposas dos integrantes da banda, as de toda equipe técnica que os acompanham e, a todas as mulheres do planeta. A primeira, "You're The Best Thing About Me", balada pop bem suave lançada no final de setembro último, mesmo pouco cantada não passou despercebida. A segunda, "Ultraviolet (Light My Way)", canção que exalta o poder de salvação do amor é a homenagem da banda à mulheres do mundo inteiro que de alguma forma, deram a sua contribuição à humanidade, "Women of the world unit", assim, Bono se refere à elas enquanto no telão, fotos dessas mulheres são exibidas, entre elas, as brasileiras Tarsila do Amaral, Chiquinha Gonzaga, Irmã Dulce, Maria da Penha e Thaís Araújo. O hino ao amor universal, confundido como uma canção de amor entre um casal, "One", é a escolhida para encerrar as três primeiras noites do show. Na introdução: "Seja nas favelas ou nos campos de refugiados, sejam um, sejam uns pelos outros", era a mensagem da banda na fala de Bono que ecoava no Morumbi completamente iluminado pelas luzes dos celulares.










MOMENTO REPETECO JÚ PARIS SÃO PAULO





Na quarta, dia 25, como boa maneira de se despedir do público brasileiro, após uma semana intensa, a banda inclui no set list "I Will Follow", música do primeiro álbum "Boy". Ironicamente de volta ao princípio para encerrar o show e a turnê, com a bandeira do Brasil ao fundo.




























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